Finalmente cheguei aqui; o engraçado é que não sinto o fim, não o avisto. Na verdade acho que as coisas estão começando somente agora. Foi uma longa e gratificante viagem onde eu consegui já avistar o topo dos prédios da minha cidade destino, mas acredito que ainda é necessário dar mais uma voltas. De tudo, pude perceber o quão importante foi passar pelos destinos da identidade e suas diferenças, do gênero e seus papéis e encarar a entrada das sexualidades e passar por elas, observando os detalhes desse destino desconhecido até então.
Pude perceber que o valor das coisas não estão nelas mesmas, mas no nosso ato de atribuir tal valor, verificando o quanto aquilo é importante a válido a nós enquanto seres humanos. Assim vi cada item, conceito, características deste trabalho. Foi mais que mera teoria; foi absorver o universal e esfregar em mim o que já era meu, mas eu não sabia, eu tinha medo.
Então pressionado me perguntei: Qual o meu medo? Eu já sabia a resposta. O medo não era só essa resposta, mas as consequências da mesma. Todo o estudo da teoria queer, das identidades, dos gêneros, das sexualidades entraram batendo na porta da minha prática e me perguntando: E aí, quando vamos viajar com você, hein?! Enquanto isso, na minha cabeça só latejava uma palavra: performance. Então assimilar uma coisa a outra e construir um todo também se tornou um medo. Pra enfrentar um eu deveria superar o outro primeiro. O primeiro medo? A família. Assumir-se pra família. Uma pedra que rola as estradas da minha viagem até hoje. Eu sempre desviando; parado não dá pra ficar. Então latejava outra questão na cabeça: Como fazer um trabalho como esse e não ser um homossexual assumido, Robson?! Você trabalhou com Teoria Queer, quem quer enganar? Está aí meu maior medo. Ter uma teoria gay para subsidiar minhas cenas é uma delícia, mas não poder mostrar isso pra minha família por medo não é nada legal. Minha estrada se fechou. Ou eu assumo pra minha família ou eu assumo esse grande abacaxi que colhi na viagem pra descascar. Certo, escolhi o abacaxi. Admito, sou gay, fiz um trabalho sobre Teoria Queer, onde defendo a imagem do homossexual afeminado, onde exponho isso tanto teóricamente quanto nas práticas e no fim das contas a coisa mais importante da minha vida não sabe. Paradoxal. Fato é que, não teria sido tão queer se não fosse como foi. Eu coloquei nesse trabalho tudo que eu nunca tive coragem de mostrar pra minha família. Admitamos, se fosse fácil não teria a mesma carga de emoção. A próxima emoção é somente minha: o ato de assumir. Não sei quando isso vai acontecer, não sei se vai acontecer, não sei como vai ser daqui em diante, mas eu acredito que assumir pra mim mesmo todas essas questões aqui abordadas, desde o título até essa linha escrita já foi um grande caminho percorrido, eu sei disso, eu me permito saber e admitir isso. A excentricidade do queer, a força das questões de gênero; discussões que parecem não ter fim. Por isso prefiro não colocar um ponto final nessa viagem. Eu tenho descobertas a fazer ainda e eu quero fazer isso. Todas as questões sociológicas foram de extrema importância, mas de certa forma ficaram limitadas ao meu universo homossexual, meu cantinho aqui nessa cidade, meus locais frequentados, meus amigos, minhas baladas. Eu quero descobrir meus pares no mundo, quero ver as possibilidades de diálogo que posso estabelecer daqui em diante, fugir desse universo de "single ladies" protegido, mas é claro, sem querer diminuir a vivência daqui. Foi aqui que a viagem começou e não dá pra jogar fora tudo isso, haveria de ter um start e as minhas vivências protegidas foram só a chave da porta que eu quero abrir pro mundo performático que existe lá fora, eu quero viajar rumo a isso, eu sei. Como eu trabalho isso, como eu uso isso, como é essa transição? Estão aí perguntas que eu admito não saber responder agora, mas tenho a chave pro caminho das respostas e acredito que já destranquei a porta. Esse trabalho não foi um fim, de maneira alguma. A busca da autobiografia enquanto um símbolo pro trabalho foi um passo já, assumir-se pra mim mesmo foi outro, admitir meus medos e usá-los também foi outro. Agora acabei de me dar conta que fiz toda essa viagem a pé. Nada melhor que caminhar. Nada precisa ser rápido, acelerado. Esse fato deixou meus prazeres aparecem e foram através deles que pude perceber meus erros e continuo a caminhada em busca de superá-los, sempre. Eu quero continuar a pé, descobrindo cada sensação de perto, podendo sentir na pele e tendo tempo suficiente pra isso. Agora eu posso. Eu posso até ter voltado pro meu armário algumas vezes, mas eu levei pra dentro dele tudo que eu vivi do lado de fora e certamente lá dentro não será a mesma coisa. O queer como subsídio realmente faz efeito; não só na cena performática, mas na vida. Na vivência do eu Robson, do eu homossexual, o eu artista, o eu.
E depois de cortar, entrar no jogo, assumir a Carolina que vivia dentro de mim, utilizar algumas próteses e transformar tudo isso em uma campanha viral de internet, é bom poder admitir que de tudo que fui, só me resta ser eu mesmo.
"Zarrô!"